No dia 30 de Novembro de 1529, dia de Santo Andrew, Henrique VIII seria censurado por duas grandes mulheres de sua vida: sua esposa, Catarina de Aragão, e Ana Bolena. Catarina estava cheia do péssimo tratamento que estava recebendo de seu marido e o confrontou.
Eustace Chapuys, o embaixador espanhol, fez um relato completo do encontro entre os dois em uma carta para Carlos V. Catarina disse ao rei que “sofria há tempos as dores do purgatório na Terra, e que foi muito maltratada por ele se recusar a jantar com ela e visitá-la em seus apartamentos”. Henrique respondeu que ela não tinha motivos ou direitos para reclamar, “porque ela era dona de sua própria casa, onde ela podia fazer o que quisesse”, e que ele estava muito ocupado com “assuntos do governo” para jantar com ela. Além disso,
“Ela deveria saber que ele não era seu marido legítimo, como inumeráveis médicos e canonistas, todos homens de honra e probidade, e até mesmo seu próprio assistente, o doutor Lee, que uma vez a conheceu na Espanha, estava pronto para dizer” e, além disso, “não deveria o Papa, em conformidade com as opiniões acima expressas, declarar seu casamento nulo e vazio? Então nesse caso ele [Henrique] denunciaria o Papa como herege e se casaria com quem quisesse”.
Catarina ficou chocada e chateada. Sua resposta foi a altura: ela declarou que Henrique VIII deveria saber, mesmo sem a ajuda de médicos, que ela era virgem na noite do casamento:
“A Rainha respondeu que ele próprio, sem a ajuda de médicos, sabia perfeitamente que a principal causa alegada para o divórcio não existia realmente, “iloit trouvé pucelle”, como ele próprio possuía em mais de uma ocasião. Quanto à opinião de seu almoner nesse assunto – continuou ela -, não me importo com isso; ele não é meu juiz no presente caso; e sim o Papa, e não deve a ele decidir. Respeitando a opinião de outros médicos, parisienses ou de outras universidades, você sabe muito bem que os principais e melhores advogados da Inglaterra escreveram a meu favor. De fato, se você me der permissão para obter a opinião do advogado sobre este assunto, não hesito em dizer que para cada médico ou advogado que decidir a seu favor e contra mim, encontrarei mil para declarar que o casamento é bom e indissolúvel.
Henrique a respondeu mas isso não foi registrado. Ele então saiu da sala “muito desconcertado e abatido”. Mas se ele esperava obter consolo com Ana Bolena, ficaria ainda mais decepcionado, pois ao contar a história, Ana disse-lhe:
Eu não lhe disse que sempre que você disputa com a rainha, ela com certeza terá a vantagem? Vejo que em alguma bela manhã você vai sucumbir ao seu raciocínio e irá me deixar. Eu tenho esperado muito, e poderia já ter contraído algum casamento vantajoso, do qual eu poderia ter tido filhos, que são o maior consolo neste mundo; mas ai de mim! Adeus ao meu tempo e juventude, gastos para nenhum propósito.
Essa cena foi recriada, em parte, na série ‘As Seis Rainhas de Henrique VIII‘ com Suzannah Lipscomb e Dan Jones.
Depois de ver que não haveria consolo de nenhuma das partes, Henrique VIII foi para seus aposentos.
Embora devemos sempre ter em mente que Chapuys estava escrevendo para seu patrão o que ele queria ouvir, suas cartas ainda são uma fonte inestimável de informações contemporâneas da corte de Henrique VIII e, se não registraram a verdade dos acontecimentos, pelo menos deixa claro o humor que havia na corte naquele momento.
Bibliografia:
November 30, 1529: Katharine of Aragon Confronts Henry VIII. Acesso em 24/07/2018.
RIDGWAY, Claire. 30 November 1529 – Catherine of Aragon Confronts Henry VIII. Acesso em 24/07/2018.
Boullan - Tudo sobre Ana Bolena e a Era Tudor 