A vestimenta de Ana de Cleves

Vestia um vestido estranho e bastante deselegante [cheio de broches, folhos e outros ornamentos], com mangas largas e cheias de roda e uma gola até o pescoço, como se fosse uma freira. A coifa, na cabeça, ocultava-lhe completamente o cabelo’.

(PLAIDY, 2000, pág. 129)

Quando Ana de Cleves chegou na Corte Inglesa, suas roupas fizeram uma impressão muito infeliz nos cortesãos ingleses. Ana, sendo alemã, naturalmente usava a moda alemã, mas isto estava longe de ser popular na Corte do rei Henrique VIII. Elizabeth Norton aponta que ‘Ana tinha crescido vestindo as modas mais pesadas e de saias redondas, populares na Alemanha e nos Países Baixos’, vestidos quais não lisonjeavam a figura feminina, coisa que, após a chegada de Ana Bolena da Corte francesa, era considerado muito importante.

Ao chegar na Inglaterra, Ana de Cleves estava com 24 anos, era alta e magra, ‘de beleza mediana, com um rosto que exprime determinação e decisão’. Ana era muito séria para os padrões ingleses e, de acordo com Antonia Fraser, ‘a moda alemã pouco fazia para dar uma impressão de encanto juvenil numa corte apaixonada, como sempre, pelo que fosse francês, ou de qualquer modo que associava ao estilo francês de alegria e prazer.’

‘O seu vestido pesado ocultava-lhe o busto curto, mas no país para onde era possível que fosse, as senhoras usavam uns vestidos assustadoramente leves em comparação com os que usavam em Cleves: nem ombros tufados, nem cintos recamados de jóias por debaixo dos seios, nem veludos e laços de seda até o queixo. Um vestido de cintura alta de um tecido pesado podia ocultar inúmeras imperfeições físicas, mas as damas, em Inglaterra, usavam uns corpetes desprovidos de enfeites e uns decotes ousados, que lhes deixavam a parte de cima do tronco desnuda.’

(HAMILTON, 1973, pág. 14)

Ao ver a nova rainha de Henrique VIII e suas damas de companhia, o Embaixador  francês escreveu para o seu país que as damas de companhia estavam ‘vestidas de forma tão pesada e desgraciosa que pareciam quase horríveis, ainda quando fossem belas’. 

Wives of Henry VIIIIngleses foram enviados para inspecionar Ana e sua irmã, para ver quais delas eram adequadas a se casar com o rei. Os enviado  encontram-nas envoltas em ‘roupas e adornos tão monstruosos’ que eles não podiam ver bem nem o corpo nem o rosto delas’. Além disso, escreveu Nicholas Wotton,  ‘é motivo de censura e, de vez em quando, considerado uma grande frivolidade’ uma dama saber cantar ou tocar algum instrumento, quanto mais ser ‘instruída.’ Ana sabia apenas falar e escrever a sua língua nativa, conhecido como dutch (holandês) cujo som os ingleses acham extremamente desagradável aos ouvidos.

Ao chegar em Rochester, em 1 de Janeiro de 1540, Henrique VIII estava em tal frenesi romântico que não podia esperar para vê-la oficialmente. Ele cavalgou disfarçado para Rochester, e estava esperando um reconhecimento imediato e romântico, assim como uma paixão avassaladora e mútua. Entretanto, isso não aconteceu. Aparentemente, Henrique se disfarçou muito bem e Ana não o reconheceu, prestando-lhe pouca atenção até o momento em que ele a abraçou.

‘Nesse momento lady Ana inclinou-se diante mim e vi que toda a sua cabeça estava envolta por uma espécie de chapéu grotesco, com asas duras e um sem-número de pregas, como uma pipa maluca.’

(GEORGE, 1993, pág. 42)

A aparência dela também não o agradou e isso, na minha opinião, foi em grande parte devido a suas vestimentas. De acordo com Jean Plaidy, ‘o vestido não lhe caía bem, com um colarinho alto e rijo, que lembrava um casaco de homem’; e isso condiz os relatos dos contemporâneos sobre sua roupa no dia após o casamento com o Rei . A escrita de Philippa Gregory provavelmente tem certa razão quando diz que, na corte, ela foi julgada ‘severamente por sua timidez e seu desconhecimento da língua, culpam-na por suas roupas e riem dela por não saber dançar, cantar ou tocar alaúde’.

Além de tudo isso, o rei não aceitava que ele não era mais o belo príncipe de outrora, que fazia qualquer mulher se apaixonar por ele à primeira vista, mesmo quando estava disfarçado. Certamente, o rei não era o sonho de uma jovem mulher neste momento: velho, obeso, com uma perna ulcerada e mal-humorado, é muito provável que Ana não o achou atraente e mostrou seu desagrado no primeiro momento, desagrado esse que outras damas inglesas eram rápidas em esconder.

Ironicamente, após o divórcio parece que Henrique e Ana tornaram-se amigos. Após certo tempo no país, Ana adotou a moda inglesa, e não parecia mais tão estranha depois de ter se livrado de seus vestidos alemãs.

Bibliografia:
PLAIDY, Jean. Assassinato Real. Tradução de Sylvio Gonçalves. Rio de Janeiro: Record, 2000.
HAMILTON, Julia. ‘Ana de Cleves’. Tradução de M. M. Ferreira da Silva – Lisboa: Edições Dêagá, 1973.
GREGORY, Philippa. O bobo da rainha. Tradução de Ana Luiza Borges, 2º Edição. Rio de Janeiro: Record, 2010.
GEORGE, Margaret. Autobiografia de Henrique VIII. Tradução de Maria Luiza X. de A. Borges. – Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993.
FRASER, Antonia. As Seis Mulheres de Henrique VIII. Tradução de Luiz Carlos do Nascimento e Silva – 2º Edição – Rio de Janeiro: BestBolso, 2010.
HACKETT, Fracis. ‘Henrique VIII’. Tradução de Carlos Domingues. Rio de Janeiro: Irmãos Pongetti Editores.

13 comentários sobre “A vestimenta de Ana de Cleves

  1. Há pouca informação sobre os motivos da antipatia mútua que em primeiro momento existiu entre Henrique e Ana Cleves, esse pequeno texto foi muito esclarecedor. Já havia lido algumas bobagens sobre esse episódio.

    • Eu também! Haha. Mas na época acredito que era visto como super esquisita (tanto é que mesmo em feiras renascentistas é raríssimo ver roupas da moda alemã)

  2. Essa foi esposa por muito pouco tempo e virou “irmã” do rei.
    Ela era mesmo muito germnânica.

    “Quando Ana chegou à Inglaterra, ficou evidente o talento de Holbein, pois a pintura superava o modelo em atributos físicos. Ana não era uma mulher bonita e tinha a cara coberta de cicatrizes de varíola, prontamente disfarçadas no retrato. Henrique VIII ficou desconsolado com a escolha da noiva desde o primeiro momento, mas apesar disso se casou com Ana em 6 de janeiro de 1540, em Greenwich.

    Uma das aias designadas para Ana foi Catarina Howard, uma jovem de quinze anos com quem o rei iniciou uma relação amorosa quase de imediato. O casamento com Ana foi anulado a 9 de julho do mesmo ano, com base na não consumação, e pouco depois Henrique VIII casou-se com Howard.”

    • Não sei de onde você tirou esse texto, mas na verdade muitos acreditam que Ana era realmente bonita, mas que Henrique era absurdamente exigente. O fato de que suas roupas eram consideradas horrorosas se comparadas com as inglesas; que ela não falava inglês, não tocava instrumentos, não dançava e nem cantava contribuíram para que Henrique não gostasse dela.

      • Tirei da Wikipedia e de vários livros ingleses e americanos que li sobre a vida de Henrique VIII.

          • Ana Maria mas nesse mesml artigo que você postou está falando sobre o assunto so retrato.
            “There has long been a rumor that Henry was so enraged with the work, believing that Holbein had deliberately duped him with a false portrait, that he fired the painter. But that is not true. At the time, there were a few remarks that she did not look as well as the portrait asserted, but this was not unlikely – she had arrived in England after a long journey, perhaps the sea air did not agree with her skin? Or perhaps nervousness over the impending marriage caused a change in her complexion. We cannot know. But we do know that Henry’s ambassadors, only too aware of their master’s wishes, allowed the portrait to be sent as a fair likeness of Anne. Would they have dared to mislead their monarch in such a way? It’s not likely. Even Henry himself did not make much of the supposed difference between the painted and real Anne, aside from a comment to Cromwell that she was ‘nothing so fair as she had been reported.’ Often expectations can be idealistic, and that was possibly the case with Henry. Holbein continued to receive commissions from the English aristocracy before dying of plague in London in 1543.”

            Além do mais não existe nenhuma prova sobre as “marcas de varíola” no rosto dela.

  3. Pelo que sei sobre Ana (o que não é muito, eu admito), ela sempre me pareceu ser uma pessoa extremamente pragmática e adaptável.
    Eu acho pouco provável que ela se mantivesse tão fiel a seu estilo de vestimenta alemã após sua chegada na Inglaterra e mesmo durante seu curto período como consorte real.
    Penso que Ana tinha uma capacidade impressionante de aceitar e tirar o melhor proveito das situações quando apresentadas a ela, sendo assim, não consigo imaginar que ela fosse tão irredutível ao ponto de não abrir mão de seu antigo modo de vida na Alemanha, principalmente porque ela sempre pareceu pronta para abraçar a Inglaterra como seu novo lar e isso incluí vestimentas e costumes.
    Pelo menos é nisso que eu acredito.

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